O Passo a Passo da Perícia Técnica em Áudio e Vídeo: do Recebimento à Análise
- Adriano Miranda
- 17 de set.
- 3 min de leitura
Você já parou para pensar em como um perito analisa um arquivo de áudio ou vídeo que se tornou uma prova em um processo judicial? Não basta apenas “dar o play”. A perícia audiovisual segue uma metodologia rigorosa para garantir que a evidência digital seja tratada com o máximo de cuidado e integridade.

A inegociável cadeia de custódia
Antes de qualquer exame, a etapa fundamental é a cadeia de custódia. Ela funciona como uma “linha do tempo oficial” da prova, registrando todo o caminho percorrido pelo arquivo: da coleta inicial até a apresentação em juízo.
No mundo digital, isso é ainda mais crítico, já que arquivos eletrônicos podem ser facilmente alterados, copiados ou corrompidos sem deixar marcas visíveis.
Um exemplo simples: imagine que um vídeo de câmera de segurança é entregue à polícia em um pen drive. Para que esse vídeo seja aceito no processo, é preciso registrar quem coletou o arquivo, quando foi coletado, como foi armazenado e quem teve acesso até o momento da perícia.
O papel do código hash
Para reforçar a integridade da prova, utiliza-se o código hash, uma espécie de “impressão digital” única do arquivo.
Se o hash calculado no momento da coleta for idêntico ao verificado durante a análise, significa que o arquivo não sofreu nenhuma alteração.
Basta um único pixel modificado ou um segundo de áudio cortado para que o hash seja totalmente diferente, indicando adulteração.
Esse procedimento é tão relevante que está previsto na Lei 13.964/2019 (Pacote Anticrime), que incluiu no CPP regras detalhadas sobre a cadeia de custódia da prova.
Os exames por trás da tela e do som
Com a integridade do arquivo assegurada, o perito pode iniciar a análise técnica. Entre os principais exames estão:
Análise de edição e autenticidade
O objetivo é verificar se o arquivo é original ou manipulado.
Em áudios, o perito pode identificar cortes ou inserções por meio de variações abruptas no ruído de fundo ou mudanças na linearidade do discurso.
Em vídeos, a análise quadro a quadro pode revelar saltos temporais, diferenças na iluminação ou descontinuidades que sugerem edição.
A análise de metadados também é crucial, pois informa detalhes como modelo do dispositivo que gerou o arquivo, datas de criação e modificações.
Exemplo: um vídeo apresentado como gravado em 2023, mas cujos metadados mostram alteração em 2024, levanta forte indício de manipulação.
Transcrição (ou degravação)
Aqui, o perito transforma o áudio em texto escrito. Mas não é só “escrever o que se ouviu”. A transcrição pericial deve registrar falas, pausas, risos, sobreposições e ruídos.
Exemplo: “[interferência de sinal]... eu vou amanhã... [risos]... no horário combinado”.Essa forma detalhada é essencial para manter a fidelidade probatória.
Textualização
Diferente da transcrição literal, a textualização busca resumir e interpretar o conteúdo, focando na mensagem principal.
Exemplo: um áudio em que duas pessoas falam ao mesmo tempo pode ser textualizado como: “As partes discutem sobre o horário do encontro e demonstram concordância ao final da conversa.”
É uma técnica útil quando o juiz precisa de clareza e não de todos os detalhes sonoros. Porém, exige experiência para não distorcer a comunicação original.
Aprimoramento de áudio e vídeo
Nem sempre as gravações chegam em boas condições. Por isso, o perito pode usar softwares especializados para melhorar a qualidade.
Em áudios: filtros de equalização de frequência podem reduzir ruídos (como o barulho de trânsito) e realçar a voz principal.
Em vídeos: ajustes de brilho, contraste e nitidez ajudam a visualizar melhor detalhes importantes, como placas de veículos ou traços faciais.
Exemplo: em um caso de assalto, uma câmera registrou imagens escuras. O perito aplicou ajustes de contraste e conseguiu identificar parcialmente a placa do carro utilizado no crime.
A perícia audiovisual é muito mais do que apertar o play em um áudio ou vídeo. Ela envolve procedimentos técnicos, cuidados com a cadeia de custódia, análises de autenticidade e recursos avançados para extrair o máximo de informação da prova digital.
Esse trabalho é essencial para que juízes e tribunais decidam com base em evidências seguras, protegendo tanto a busca da verdade quanto os direitos das partes envolvidas.




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